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Sinto muito ciúmes, o que devo fazer?

Este texto pretende apresentar reflexões sobre uma temática muito presente nos relacionamentos: o ciúme. Estabelecer e manter relacionamentos pode ser desafiador, são pessoas diferentes se relacionando, exigindo flexibilidade e diálogo das partes, implicados em fazer com que a relação funcione. Pode existir em um relacionamento percepções e necessidades diferentes, mas se alguém no relacionamento não se sente valorado ou compreendido da forma que necessita, pode fazer com que impere na relação uma sensação de ameaça e insegurança.

Para compreender mais sobre o ciúme, esta reflexão será construída a partir dos pontos abaixo:

– O que é o ciúme e por que o sentimos?

– Um jeito de construir relações

– Qual o limite saudável do ciúme?

– Dicas para lidar com seu ciúme

O que é o ciúme e por que o sentimos?

O ciúme é uma emoção complexa que engloba sentimentos que perpassam a desconfiança, a raiva e a humilhação. Afeta pessoas de todas as idades, gêneros e orientações sexuais, e é geralmente iniciado quando uma pessoa percebe uma ameaça a um relacionamento valioso de um terceiro, sendo que a ameaça pode ser real ou imaginária.

Homens e mulheres sentem ciúmes, todavia, estudos sugerem que, no contexto de relacionamentos românticos, os homens sentem mais ciúmes da infidelidade sexual (real ou percebida), enquanto as mulheres tendem a sentir mais ciúmes da infidelidade emocional. O ciúme é muitas vezes pensado no contexto de relacionamentos românticos: por exemplo, um namorado que proíbe sua namorada de conversar com outros homens. Mas o sentimento pode ocorrer em quase todos os tipos de relacionamento humano – em amizades, irmãos competindo pela atenção dos pais, colegas de trabalho tentando impressionar um chefe respeitado, entre outras situações.

Embora o ciúme seja uma experiência emocional que carrega desconforto e sofrimento, estudos psicológicos o compreendem como um alerta de que um relacionamento valioso está em perigo e que ações precisam ser efetivadas para reconquistar um equilíbrio nesta relação. Desta forma, o ciúme é visto como uma emoção necessária, pois preserva os laços sociais e motiva as pessoas a se engajarem em comportamentos que mantêm relacionamentos importantes, satisfazendo a necessidade humana de pertencimento e relações sociais.

O ciúme injustificado muitas vezes causa inquietação ou insatisfação no relacionamento, e as pessoas ciumentas podem se comportar de maneiras irracionais ou até perigosas. Mas o ciúme é um sentimento natural e adaptativo projetado para preservar relacionamentos importantes. Sentir ciúmes pode sinalizar o valor de um relacionamento ou que duas pessoas estão se afastando.

Um jeito de construir relações

A teoria do apego, desenvolvida pelo psicólogo John Bowlby, descreveu que o modo como nos relacionamos com pessoas significativas facilita ou dificulta o regular nossas emoções com elas, desenvolvemo-nos então como capazes de internalizar uma sensação de segurança ou insegurança em relação a outras pessoas.

Nossos relacionamentos na primeira infância com os cuidadores principais podem estabelecer os padrões básicos que usaremos para estabelecer e manter (ou não) nossas conexões com os outros ao longo da vida. Os quatro padrões básicos, conhecidos como estilos de apego, são: seguro, entitativo/inseguro, ambivalente ou desorganizado.

Pessoas com estilos de apego seguro provavelmente não se sentirão excessivamente ciumentos ou inseguros em seus relacionamentos. Na infância, eles normalmente tiveram pais que eram consistentes em fornecer amor e apoio, onde as palavras dos pais eram congruentes com suas ações e onde as conexões eram rápida e facilmente restabelecidas após períodos de separação. Crescendo em tais contextos, as pessoas com apego seguro não precisam vasculhar o ambiente social em busca de ameaças ou se proteger de decepções, desligando e ficando entorpecidas. Em vez disso, quando confrontados com desafios sociais, eles podem avaliar com precisão se estão em risco de danos, obter apoio e segurança de maneira apropriada e tomar decisões difíceis quando necessário.

Em contraste, as pessoas que desenvolvem estilos de apego entitativo começam com baixas expectativas de que as necessidades emocionais serão atendidas nos relacionamentos. Tendo sido criados por pais que eram consistentemente indisponíveis, emocionalmente pouco responsivos e não oferecendo muito em conforto, eles não esperam mais nada em seus relacionamentos românticos adultos. Como tal, eles não tendem a ficar com ciúmes ou buscar excessivamente segurança. Pelo contrário, se eles perceberem que seus parceiros arriscam se perder, eles podem simplesmente se virar e se afastar ou se desligar e se desvencilhar.

Aqueles com estilos ambivalentes são hiper vigilantes para as coisas que dão errado nos relacionamentos e, porque eles examinam continuamente o horizonte social em busca de sinais de ameaça, provavelmente não ficarão calmos por muito tempo, mesmo quando a garantia é fornecida. Então, eles rapidamente pedem mais garantias ou descobrem que a garantia que é oferecida está em falta. Eles, portanto, tendem a pressionar a questão até o ponto em que os parceiros podem ficar exasperados e desistir de tentar. A busca excessiva de garantias torna-se assim uma profecia autor realizável.

Na infância, os pais daqueles com estilos ambivalentes tendiam a ser inconsistentes em sua disponibilidade e/ou capacidade de resposta. Pessoas com estilos preocupados, portanto, aprenderam cedo que você não pode necessariamente confiar na disponibilidade de parceiros de relacionamento, mesmo quando eles oferecem garantias. Eles também aprenderam que frases como “eu te amo” não significam que a outra pessoa não colocará a si mesma ou aos outros em primeiro lugar e a deixará se sentindo insegura e por conta própria. Então, eles tendem a operar com a ideia de que, enquanto você mantiver o parceiro de relacionamento em sua mira, você saberá o que eles estão fazendo. Por extensão, você pode evitar ser abandonado ou traído.

As pessoas com estilos de apego desorganizado foram muitas vezes criadas por pais que eram amedrontadores. Seus pais tendiam a ser muito imprevisíveis e abusivos. Assim, eles também esperam inconsistência e se machucam em seus relacionamentos românticos adultos. Devido à natureza caótica de seus ambientes no início da vida, eles podem exibir uma mistura de estratégias de evitação (como a pessoa que dispensa) e estratégias ansiosas (como a pessoa preocupada). Eles podem inicialmente pedir muita tranquilidade ao sentir ciúme apenas para atacar agressivamente ou desligar completamente e cortar o contato. Se você está em um relacionamento com uma pessoa com apego desorganizado, pode ter uma sensação constante de agressões psicológicas.

Compreender o padrão desorganizado de detecção de ameaças, ciúme e busca excessiva de segurança provavelmente trará mais frutos. Aqueles com apego entitativo e ambivalente têm altos níveis de ansiedade de apego, em que o mecanismo de detecção de ameaças de relacionamento do cérebro fica preso no modo de alerta, como se fosse um radar altamente sensível que detecta ameaças reais e imaginárias.

Qual o limite saudável do ciúme?

Por mais que o ciúme seja uma emoção comum, ele também tem o potencial de alimentar comportamentos prejudiciais. Pode obrigar alguém a monitorar obsessivamente a comunicação, os relacionamentos e o paradeiro de outra pessoa; tentar diminuir sua autoconfiança; ou até mesmo se comportar violentamente.

Mesmo que pareça um tabu, simplesmente reconhecer a presença do ciúme pode ajudar a evitá-lo no futuro e fortalecer um relacionamento no presente. Explorar as emoções que sustentam o ciúme pode inspirar autorreflexão que pode ajudar a desenvolver habilidades internas de enfrentamento. Ser honesto com a outra parte sobre sentimentos de ciúme pode estimular conversas produtivas sobre o que pode estar faltando no relacionamento e como reparar o vínculo.

O ciúme pode facilmente cruzar a linha do comportamento controlador. Se seu parceiro, amigo ou ente querido monitora seu comportamento, ou paradeiro, faz acusações falsas ou tenta isolá-lo de pessoas que provocam ciúmes, o relacionamento se tornou doentio e potencialmente perigoso. Procure ajuda para ela e para você!

Não há cura instantânea para o ciúme. Mas aceitar que o ciúme é normal, desafiar a mudar seu modo de funcionar que busca ameaças, ser mais consciente de si e tentar desenvolver formas de confiança com as pessoas podem lhe ajudar a lidar com essa emoção. Quando o ciúme é algo que tem atrapalhado suas relações, é importante também conversar com um terapeuta para lhe ajudar nesta tarefa de mudar seu jeito de ser e se relacionar.

Dicas para lidar com seu ciúme

Uma pessoa que se sente insegura e com o modo de alerta do ciúme ligado o tempo todo fica exausta, despendendo uma energia grande para avaliar as relações e situações o tempo todo, sem contar que atrapalha a qualidade das relações e comunicação delas. Esse modo de viver em alerta nos faz ampliar nossas desconfianças e agir de modo nada controlado.

Mas o que fazer para lidar com seu ciúme? Seguem algumas dicas que pode ajudar a se perceber e lidar de outra forma com esse sentimento:

– Não aja por impulso: obtenha uma segunda opinião antes de agir. Compartilhe suas inseguranças com seu terapeuta ou pessoa de sua confiança antes de fazer acusações desnecessárias, ou exigir satisfação de algo que você percebeu.

Tenha conversas significativas sobre seu relacionamento só depois de sua crise de ciúme ter diminuído. No calor do momento da desconfiança acabamos não conseguindo dialogar e nos comunicamos de forma violenta, atrapalhando a resolução do conflito.

– Tente estabelecer uma conversa aberta, tentando confirmar se a ameaça que percebeu aconteceu realmente. Compartilhe suas inseguranças com seu parceiro e peça ajuda para lidar com seus sentimentos e percepções.

– Evite viver de um modo a buscar ameaças constantes. Se você tem um radar sensível a possíveis ameaças, para de procurá-las intencionalmente. Tente mudar seu jeito de buscar inseguranças e foque em algo diferente quando se perceber avaliando possíveis situações de ciúme.

Mudar um padrão aprendido de estabelecer relações pode ser muito desafiador, por isso a facilitação deste processo pode ser fundamental! Se você precisar de ajuda nesse processo, conte com nossa equipe! Clique aqui e converse com uma de nossas psicólogas para conhecer mais e entender o que faz sentido para você.

Referência consultada:

ALMEIDA, T.; RODRIGUES. K. R. B.; SILVA, A. A. O ciúme romântico e os relacionamentos amorosos heterossexuais. Estudos de Psicologia, 2008, 13(1), 83-90. Disponível em: https://www.scielo.br/j/epsic/a/y6b73rHN5GPVcwCNnfHJZRr/?lang=pt&format=pdf. Acesso em 01 set 2022.

Juliana Fitaroni

Juliana Fitaroni

Psicóloga, CRP 18/02964

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