Blog do Espaço

Quando a positividade pode se tornar tóxica?

Quem nunca tentou pensar positivo para ver se um desejo se realizaria? Pois, bem! Mas esse pensamento “quase mágico” não é a única perspectiva de pensamento positivo que existe. Ele pode ser associado a uma atitude otimista diante dos desafios da vida, assim como pode se tornar uma imposição ao ponto de ser considerado tóxico. É sobre estas diferentes perspectivas que vamos refletir no texto de hoje.

Quando o pensamento positivo pode trazer benefícios?

O otimismo e os pensamentos positivos têm sido apontados pela neurociência, como estados de saúde mental que promovem a liberação de certos hormônios relacionados à sensação de bem-estar, felicidade e prazer, como a serotonina e a ocitocina, por exemplo. Neste sentido, assumir uma atitude com foco nas possibilidades de resolução das adversidades, pode sim, contribuir para o bem-estar das pessoas.

Esta atitude otimista ao interagir com a realidade não antecipa ou sentencia as situações a um desfecho adverso, como uma atitude pessimista, ao contrário disso, mantém a procura de saídas enquanto existirem possibilidades. Portanto, essa atitude pode aproximar as pessoas do seu potencial de gerenciamento da vida, assim como pode contribuir para que a percepção mantenha viva sua capacidade de selecionar os elementos da realidade que podem contribuir para a resolução da questão.

No entanto, o pensamento positivo, nem sempre se aplica de forma favorável, assim como não esgota suas possibilidades de compreensão nestas perspectivas que acabamos de apresentar. Um exemplo disso é quando as adversidades da vida trazem impacto prejudicial para a pessoa, de modo que apenas uma atitude de pensamento positivo não será suficiente para os cuidados necessários com sua saúde mental. E este é apenas um dos exemplos em que a positividade imposta pela própria pessoa ou por terceiros pode se tornar prejudicial para sua saúde mental, vamos continuar estas reflexões.

Quando o pensamento positivo pode se tornar tóxico?

Partindo da compreensão de que pensamentos positivos e atitudes otimistas diante da vida podem ser favoráveis em muitas circunstâncias e, por outro lado, extremamente inoportunos em outras, não se trata de uma inversão dos polos onde se pretenda abolir a positividade e assumir uma atitude pessimista. Trata-se, no entanto, de compreender: como e, porque a positividade excessiva pode se tornar prejudicial ao ponto de ser considerada “tóxica”?

A questão central desta reflexão é que uma das características que nos torna humanos é que sentimos emoções e sentimentos, que vão de um espectro básico até o complexo: medo, raiva, alegria, tristeza, angústia, ansiedade, felicidade, entusiasmo, desânimo, entre tantos outros. Quando classificamos as emoções como positivas e negativas e tentamos suprimir as negativas, na tentativa de controlar as adversidades, acabamos desconsiderando muitos aspectos da nossa totalidade.

Um exemplo disso é quando vivenciamos experiências que nos despertam emoções e sentimentos dolorosos como uma perda significativa. Um evento como este vem acompanhado de um processo de luto, com ciclos de elaboração que também envolve emoções intensas, hostis, além dos sentimentos de conexão, afeto e ressignificação do que foi perdido. Para a elaboração do luto é necessário o reconhecimento, a vivência e processamento do significado das emoções, sejam elas hostis ou não. Neste caso, a restrição dos pensamentos e emoções ditas positivas poderia trazer prejuízos importantes para a elaboração do luto, portanto, para a saúde mental das pessoas.

Como a positividade toxica se desenvolve?

É possível que você já tenha se deparado com o movimento frequente nas redes sociais que propaga a ideia de que o pensamento positivo, as emoções positivas e as atitudes positivas são beneficiais certos para a prosperidade da vida. Não é ao acaso que tais ideias se disseminem com facilidade, visto que é uma saída da humanidade ao longo da nossa história, buscar suprimir da realidade aquilo que temos dificuldade de conviver. Então sim! Muitas vezes a intensão é de fato ajudar, contribuir para o bem-estar das pessoas, muito embora acabe com um efeito silenciador de emoções vitais para a saúde mental de tantas pessoas.

Estamos chamando efeito silenciador a “não permissão”, “não validação” das expressões de ansiedades, angústias, dores emocionais, mágoas, sem falar de violências de gênero, étnico-raciais e de classe. Um processo que acontece às avessas e imperceptível à muitos pelo desejo de enfatizar apenas os aspectos positivos da experiência, mas que não contempla sua totalidade.

Não queremos dizer com isso que não haja circunstâncias em que o pessimismo se instaura de modo que a pessoa perde a perspectiva de saída. Aqui há um dos exemplos onde a atitude otimista pode ser bem-vinda, mas há circunstâncias, como no exemplo do processo de luto, em que, sem a vivência das emoções ambíguas e ambivalentes, torna-se difícil avançar para uma ressignificação.

A positividade silenciadora pode se tornar tóxica ao acumular sentimentos que precisam de espaço, expressão e acolhimento. Isso pode acontecer de fora para dentro, quando a pessoa procura relações de segurança e acolhimento para sua expressão, assim como pode acontecer na relação da pessoa com ela mesma, quando não se autoriza, não se legitima e desconsidera sua própria dor. E cabe ressaltar ser comum que as pessoas já tenham vivido a primeira situação antes de desenvolver a segunda.

Sendo assim, a positividade torna-se toxica quando há uma obsessão, fixação no pensamento positivo e exclusão dos demais.

Ampliando a perspectiva de compreensão sobre a positividade

O pensamento positivo nos chama para a importância do otimismo, sobre o quanto esta perspectiva é beneficial para o bem-estar, na sua totalidade. A questão, no entanto, é que o otimismo não exclui as adversidades da vida. E em se tratando de momentos de vida como o atual, e circunstâncias de vida adversas de tal modo que trazem consigo desigualdades históricas, não há positividade que sustente os processos de saúde mental das pessoas, sem mergulhos intensos em sentimentos de ansiedade, angústia e tristeza.

Não é que o otimismo seja a pílula mágica capaz de excluir sentimentos adversos. Assim como reconhecer a ingenuidade de um otimismo excessivo é apenas um passo do processo para conviver com as adversidades intrínsecas às condições de vida de muitas pessoas.

Então, quando você desejar trazer positividade para a vida das pessoas ou para a sua mesma certifique-se desses 3 aspectos:

  • Garanta que haja espaço de escuta empática e de acolhimento das emoções e sentimentos hostis pelo tempo que for necessário para que a pessoa possa se sentir pronta para se conectar com seu potencial de gerenciamento das adversidades.
  • Certifique-se de que não esteja pressionando a pessoas a se sentir bem, leve ou feliz quando, na verdade, não está. Na dúvida, pergunte ou converse abertamente sobre o ponto de referência interno da pessoa.
  • Caminhe com a pessoa em direção à ampliação da perspectiva de compreensão sobre a vivência e sobre a própria pessoa. E lembre-se que se vocês estiverem se sentindo às voltas, em repetição de diálogos que não parecem avançar, um profissional da Psicologia pode ser de grande ajuda nesse processo.

Se ao ler este texto, você percebeu que tem tido atitudes de positividade excessiva, com as pessoas ou com você mesmo, saiba que você não está sozinho. Perceber suas atitudes já é um indicativo do desejo de ampliar sua compreensão sobre si. Se quiser conversar com uma psicóloga da nossa equipe para saber como a Psicologia pode ajudar, clique aqui.

Se este texto fez sentido para você compartilhe com outras pessoas que também podem se beneficiar destas reflexões. Obrigada por acompanhar até aqui. Até o próximo texto.

Maira Flôr

Maira Flôr

Psicóloga, CRP 12/08932

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts Relacionados:
Relacionamento Humano

O valor das relações humanas

Vivemos em um mundo cada vez mais tecnológico, com redes sociais múltiplas, com diversas funções e formas de nos relacionarmos, seja por imagem, por áudio,

Ler Mais »
Assine a Newsletter do Espaço!

Compartilhe: