Você já deve ter ouvido muito sobre a adolescência: época de transição; conflitos de gerações; construção histórica recente; mudanças físicas, cognitivas e emocionais. É um período muito estudado, justamente porque acarreta impactos muito importantes tanto para o adolescente quanto para a sua família.
E se você convive com adolescentes, sabe que muitas questões impactam no contexto e dia a dia da família, uma dessas questões é o afastamento dos pais. Você sabe por que isto acontece? É saudável para o desenvolvimento? Até que ponto deve ser respeitado? Se você tem estas dúvidas, este texto pode ajudar na sua reflexão. Para tanto, escolhemos três pontos principais:
1. O porquê! Elementos que justificam o afastamento;
2. O outro lado! A repercussão para os pais;
3. O encontro! Como respeitar o afastamento e facilitar a aproximação.
1. O porquê! Elementos que justificam o afastamento
Estudando e pensando sobre a adolescência, temos alguns elementos que ajudam a compreender o que leva o adolescente a se afastar dos pais.
Um dos aspectos que é necessário destacar é a forma de pensamento do adolescente. Segundo Jean Piaget, é neste período que se inicia o pensamento formal. Traduzindo em termos bem simples, enquanto o modo de pensar da criança é muito voltado para o real, na adolescência a nova forma de pensar permite se libertar do real, construindo um modo próprio de reflexões e teorias. Esta nova lente para observar o mundo o impulsiona a querer ultrapassar aquilo que já existe e a transformar o mundo. E então, partindo deste pressuposto, os pais, de certa forma, representam algumas ideias e forma de viver que o adolescente quer muito transformar.
Outro aspecto que justifica o afastamento é a busca da individuação. É na adolescência que a busca por autonomia, independência e a construção da própria identidade acontecem mais fortemente. Para que isto ocorra de forma saudável, acontece naturalmente um certo afastamento dos cuidados e controle dos pais. O adolescente se afasta para elaborar e praticar o que pensa para si próprio, e acaba por valorizar muito e a se aproximar de outros que estão vivendo e passando por este mesmo momento, por isto as amizades ganham nova tonalidade.
2. O outro lado! A repercussão para os pais
Agora que já compreendemos os motivos que justificam um certo afastamento na família, é importante refletir quais os impactos a adolescência dos filhos podem gerar para os pais. Se este período é desafiador para o adolescente, podemos dizer que ele igualmente é para os pais. Com tantas mudanças e novos horizontes, muitos sentimentos diferentes e questionamentos podem surgir.
De uma forma geral, os pais tendem a construir a sua vida em função da família. Organizam a casa em função dos filhos, fazem sua rotina incluindo as atividades dos filhos, trabalham para dar o maior conforto possível, algumas famílias renunciam à carreira justamente para acompanhar e ficar mais próximo das crianças. E com a chegada da adolescência, por vezes um sentimento de vazio toma conta, o adolescente passa a buscar sua autonomia e não está tão disponível para os cuidados dos pais. Outros pais relatam um sentimento de perda de controle, se antes era responsável por cada detalhe da vida da criança, agora não é mais com o adolescente.
Outro ponto importante é que não ter o adolescente sob seus cuidados constantes pode gerar uma preocupação ainda mais acentuada com segurança e bem-estar. Angústias e ansiedades podem surgir deste dilema do tanto de liberdade a se conceder em contraposição com não saber por onde anda o filho e o que está fazendo naquele momento.
Enfim, cada família é única e, portanto, este processo tanto para o adolescente quanto para os pais ganha contornos muito pessoais. No entanto, duas questões são bem importantes e podem ajudar neste momento: a primeira delas é compreender e buscar informações sobre a adolescência, saber o que esperar deste momento da vida pode ajudar na elaboração dele; a segunda diz respeito a um autocuidado necessário para os pais, refletir como tem repercutido em si mesmo a adolescência dos filhos, pensar em quais questões e sentimentos têm aparecido mais fortemente em si, ajudam a perceber como está o momento e o que é possível rever para contribuir com este contexto familiar.
3. O encontro! Como respeitar o afastamento e facilitar a aproximação.
Se você chegou até aqui, deve estar se perguntando: então devo aceitar este afastamento como algo próprio deste período? E a resposta mais simples é: sim e não!
Se por um lado sabemos que para passar pela adolescência de forma saudável, conseguindo assumir as responsabilidades da vida adulta, se afastar dos pais é algo esperado, necessário e deve ser respeitado. Por outro lado, o adolescente ainda não tem maturidade cognitiva para assumir todos os seus atos, há uma distância entre a tão sonhada autonomia e a real capacidade que têm de lidar com as situações sozinho. Então é muito importante que o adolescente consiga ir para vida, ter as suas experiências, mas que possa se sentir seguro de voltar e pedir apoio a qualquer momento para os pais.
Finalizamos com algumas dicas para que o afastamento seja respeitado, mas que seja construída uma conexão, uma aproximação com os pais e família:
– Abertura genuína ao diálogo: buscar ouvir realmente o que o adolescente tem a dizer. Não agir como se já soubesse o que ele está sentindo, muito menos já vir com orientações prontas. Lembre-se de que o adolescente também está se conhecendo e reconhecendo, então não tem como saber tanto sobre ele.
– Ter momentos de conexão em família: ter um filho adolescente não significa que o dia a dia vai ser de estresse constante. Procure manter momentos de conexão em família, conforme o que faz sentido para sua família: uma refeição do dia juntos, jogos em família, ouvir música, um passeio, enfim, algo que todos apreciem. E lembre-se, nestes momentos o objetivo é de curtir, fortalecer os laços, não de aproveitar para falar sobre aquilo que está incomodando;
– Faça acordos: converse e tente estabelecer limites juntos. Imposições podem fazer com que o adolescente se afaste ainda mais. Perceba em que situações é possível conceder maior autonomia e quais situações é necessário maior acompanhamento, como as questões relacionadas à segurança.
Em resumo, a adolescência é um período muito desafiador para a família e é ao mesmo tempo, um lindo processo de desabrochar para a vida adulta! O afastamento natural e saudável não é uma rejeição ou uma afronta aos pais, é uma necessidade do período de desenvolvimento. A abertura para vivenciar este momento é uma grande oportunidade de aprendizado para todos.
E lembre-se, se vocês estiverem com dificuldade de construir esta relação familiar com o adolescente, se este afastamento do adolescente for muito intenso impossibilitando o diálogo ou se estiver lhe causando muitos sentimentos de angústia e ansiedade, é possível que uma psicoterapia ou orientação aos pais possa ajudar. Se este for o caso, sinta-se à vontade para consultar uma das nossas psicólogas, através deste canal aqui.