Blog do Espaço

O que é Psicopedagogia clínica?

Um psicólogo que ensina? Ou um pedagogo que atende? Brincadeiras à parte, as derivações de questionamentos como estes podem surgir quando vemos dois nomes conhecidos em uma só atuação. Uma coisa é certa: envolve aprendizagem e Psicologia, mas o que isto quer dizer e o que este profissional faz? Vamos entender juntos.

Geralmente entender a origem das palavras nos aproxima da essência delas, veja essas:

Pedagogia: esta palavra tem origem grega em que “Paidos” significa “criança” e “Agoge” significa “conduzir”. Assim, o pedagogo é aquele que conduz a criança.

Psicologia: vem de “Psykhe” que significa “alma” e “Logia” que significa “estudo de”. Logo significa o estudo da alma.

Derivando para Psicopedagogia: Psykhe + Paidos + Agoge = alma, criança e condução.

Podemos entender dessa forma então: aquele que conduz uma criança está fazendo parte do seu processo de desenvolvimento e, portanto, de aprendizagem e, além disso, incluindo as influências que a sua “psique” pode estar passando e influenciando seu caminho como aprendiz.

A Psicopedagogia surgiu para trabalhar com as dificuldades no processo de aprendizagem, compreendendo-as e encontrando recursos de superação dos limites.

Como dissemos no artigo sobre Neuropsicologia, é muito mais do que a junção de duas áreas (Pedagogia e Psicologia). Isso me fez lembrar Carl Rogers, psicólogo humanista, que dizia que toda psicoterapia é uma aprendizagem e toda aprendizagem é psicoterapêutica. A relação destas duas áreas transcende o seu fazer, parece que se encontram na natureza do seu produto. E a Psicopedagogia também se encontra nesse produto, fazendo parte do processo de superação dos limites na aprendizagem.

Para entendermos melhor esse mundo vamos passear por:

  • – O processo de aprender
  • – As Dificuldades de aprendizagem
  • – E, para finalizar, as dúvidas mais frequentes sobre essa área clínica

Sobre o processo de aprender

Diversos são os autores e as frentes que estudam a aprendizagem ou, como diria Vygotsky, (psicólogo estudioso do desenvolvimento humano) o processo de ensino-aprendizagem. Basicamente, e de forma bastante simplificada, aprender significa passar de uma etapa de desenvolvimento para outra mais complexa, avançada ou ainda mais madura.

É um processo inerente ao ser humano que envolve diversos fatores, veja alguns deles:

– Pedagógicos: método pedagógico de ensino, instrumentos pedagógicos, avaliações, didática, professores, escola.

– Psicológicos: dinâmica de personalidade, habilidades emocionais e relacionais, relações facilitadoras, dinâmica familiar, fase da vida, processos de luto, traumas.

– Neurológicos/fisiológicos/orgânicos: condições neuropsicológicas, síndromes, transtornos, condições de funcionamento orgânico, nutrição.

– Antropológicos/culturais/sociológicos/políticos: condições socioeconômicas, relações culturais, contexto sócio-histórico, condução política, valores.

constante vir a ser

Isso mesmo! É uma área pra lá de complexa em que o ser humano precisa ser compreendido por inteiro, como um continuum, um processo de constante vir a ser. Somente assim pode ser ajudado com efetividade em seus processos de aprendizagem.

Esse processo nem sempre foi estudado e considerado como um campo de investigação, mas hoje, mais do que nunca, sabemos a importância de compreendermos como aprendemos, afinal, sabemos que não é mais uma tarefa apenas para as crianças. Quem aí tem que aprender a mexer em tecnologias novas ou ainda aprender a lidar com um contexto de vida novo?

Os processos de aprendizagem acontecem a vida inteira, mas por que geralmente nos vem a imagem de crianças quando escutamos sobre esses temas que estamos discutindo? Porque é quando começamos a viver e por isso aprender! Aprendemos desde que nascemos!

Pensem comigo, a aprendizagem acontece em todas as células do nosso corpo, mas principalmente no nosso Sistema Nervoso Central. Nosso cérebro é uma rede de conexões a serem feitas pelo resto das nossas vidas com os estímulos que vamos receber do ambiente em que estamos. Tudo que aprendemos passa a fazer parte de quem somos (literalmente: nas conexões feitas no nosso cérebro!). E é na infância que vivemos nosso maior período de prontidão, propício para aprendermos o processo de aprender a aprender, afinal nosso cérebro está lá “novinho em folha” pronto para fazer quantas conexões novas forem necessárias.

Talvez o mais importante seja reconhecermos que todas as pessoas têm um organismo direcionado à aprendizagem. Isto quer dizer que não importa quem, nem mesmo nossas condições físicas e psicológicas, somos seres em constante processo de busca por aprendizagem o que nos faz ter condições de usar os conhecimentos para manejar a realidade e sermos autônomos.

Dificuldades de aprendizagem

Na infância também é quando começamos a frequentar a escola formal. Sim, é quando mais percebemos as dificuldades de aprendizagem. Muito se falou e se fala até hoje sobre a defasagem escolar estar relacionada a diversas dificuldades de aprendizagem que não são vistas e cuidadas. Hoje para além da escola, sabemos que as dificuldades influenciam diretamente o jeito de viver das pessoas que podem passar por sofrimentos a partir de limitações com as quais não sabem o que fazer.

As dificuldades na aprendizagem podem ser as mais diversas e nem sempre conseguimos identificar o que está influenciando e impossibilitando esse processo de ensino-aprendizagem fluir.

Uma dificuldade nos primeiros anos de vida pode ser proveniente de tantas questões que mal podemos enumerar, dentre elas:

  • – Esta criança está vivendo alguma dificuldade ou conflito em casa?
  • – Teve alguma perda recente?
  • – Aconteceu alguma negligência no seu processo de desenvolvimento?
  • – Como estão suas relações sociais?
  • – E seu desenvolvimento fisiológico?
  • – Tem alguma suspeita de uma condição neuropsicológica, como o autismo?

São tantas as perguntas e reflexões necessárias para entender o processo de aprendizagem de alguém que a lista ficaria muita extensa se citássemos todas.

Muitas dificuldades podem ser resultantes de aspectos emocionais e relacionais, algumas ainda podem estar relacionadas a déficits ao longo do seu processo de desenvolvimento por diversos motivos, seja por um processo escolar precário ou ainda por negligências às necessidades básicas físicas ou emocionais.

Nem sempre são questões trabalhadas em psicoterapia que ajudam a superar as dificuldades escolares de uma criança. Elas podem ter dificuldades de aprendizagens que precisam de um tipo de serviço que ultrapasse o relacional e o afetivo, mas que englobe seu desenvolvimento cognitivo e suas dificuldades quanto ao processo de aprender. É o caso das dificuldades que provêm de condições do desenvolvimento e fisiológicas, como os transtornos de aprendizagem.

transtornos de aprendizagem

Eles podem afetar a evolução para aprender a ler, escrever, entender números, falar, orientar-se no espaço e no tempo, permanecer atento nos momentos de estudo, entre outras características.

Seguem alguns dos transtornos de aprendizagem mais conhecidos:

– Déficit de atenção e hiperatividade: caracterizada pela distração, agitação, hiperatividade, impulsividade, esquecimento e desorganização.

– Dislexia: interfere na leitura e escrita e é caracterizada pela dificuldade no reconhecimento preciso e fluente das letras e das palavras, na habilidade de compreensão leitora e em soletração.

– Discalculia: interfere na habilidade de compreender e manipular números e raciocínios matemáticos.

– Dislalia: afeta a qualidade da fala da pessoa, caracterizada pela dificuldade de articulação de palavras: pronuncia determinadas palavras de maneira errada, omitindo, trocando, transpondo, distorcendo ou acrescentando fonemas ou sílabas a elas.

– Disgrafia: afeta a qualidade da escrita da pessoa, no que se refere ao seu traçado ou à grafia.

Estes são apenas alguns exemplos já que as dificuldades no processo de aprender podem ser muitas e ainda podem estar associadas umas às outras. Cada pessoa com dificuldade de aprendizagem é um mundo a ser compreendido.

compreender a aprendizagem

O importante é percebermos estas dificuldades para compreendermos o que está acontecendo com a criança e, caso já tenha passado a infância, com o adolescente ou adulto. Ao conhecer sua forma de aprender a superação dos limites se torna possível para que seu desenvolvimento e a relação consigo mesmo e com a aprendizagem sejam potencializados.

Perguntas básicas:

Depois de nos localizarmos sobre o processo de aprender e as dificuldades de aprendizagem vamos para algumas perguntas básicas sobre a Psicopedagogia.

A psicopedagogia só acontece no contexto clínico?

Não, existe também a Psicopedagogia institucional em que os profissionais trabalham facilitando o processo de aprendizagem em escolas, hospitais e empresas, por exemplo.

Como o cuidado psicopedagógico acontece na clínica?

Inicia-se com uma avaliação psicopedagógica detalhada sobre o processo de aprendizagem da pessoa que busca ajuda em que passamos por toda a complexidade que comentamos anteriormente.

Depois do mapeamento do jeito de aprender e todas as variáveis que influenciam esse processo é feito um plano individual com objetivos a serem alcançados para que a pessoa possa encontrar caminhos de aprendizagem e superação.

Quando as dificuldades de aprendizagem se tornam visíveis?

Na escola, com certeza, mas em entrevistas iniciais com os pais ao fazermos as perguntas precisas sobre o processo de aprender do seu filho, eles passam a reconhecer suas dificuldades no dia a dia.

Assim como adultos também reconhecem suas dificuldade ao longo da vida, mas principalmente no processo de escolarização e profissional, essa separação entre a aprendizagem escolar e as aprendizagens em casa ainda existe, mas tenho percebido que tem sido uma grande descoberta e talvez uma quebra de paradigma nos últimos tempos. As pessoas estão se percebendo e percebendo seus filhos cada vez mais de forma total e não apenas em ambientes de ensino.

O psicopedagogo trabalha sozinho?

O trabalho psicopedagógico não acontece isolado. Você já deve imaginar nessa altura que um trabalho como esse é efetivo quando trabalhamos com um tripé: pessoa, pais e escola. Junto com a sociedade e a cultura temos uma rede que se transforma continuamente.

Muitas escolas possuem profissionais da psicopedagogia (Psicopedagogia institucional), o que amplia as possibilidades de intervenção em conjunto com a clínica frente às limitações e potências na aprendizagem do aluno.

Somente crianças usam desse serviço?

Não. Como conversamos, ao longo da infância e da escolarização, é quando percebemos nossas maiores dificuldades de aprender e que podem, inclusive, comprometer o nosso desenvolvimento e o quanto damos conta de ir adiante nos nossos projetos. Na adolescência podemos ter dificuldade de terminar os anos escolares e ainda influenciar nossas relações afetivas, sociais e conosco mesmos, além dos desafios em passar em uma faculdade e concluir suas etapas. Adultos reconhecem essas dificuldades na área profissional e em processos de autonomia também.

Estamos em uma geração de long life learning e somos portanto eternos aprendizes. Por isso nossas dificuldades de aprendizagem podem ser sempre consideradas e superadas para seguirmos conduzindo nossas aprendizagens com mais fluidez.

Percebem a dimensão de tudo que conversamos?

Entendemos o ser humano de forma completa, considerando todo seu processo de desenvolvimento, não apenas uma “fase que vai passar”. As fases passam sim, mas nossas características seguem para outras fases a partir do que demos conta de viver nas anteriores. Por isso, a importância de cuidarmos do nosso processo de aprender assim que reconheçamos dificuldades limitadoras.

eternos aprendizes

Para além de uma sucessão de fases escolares e universitárias, aprendemos a aprender ao longo da vida. Isso quer dizer que, como eternos aprendizes, somos motivados pela abertura para a experiência e, assim, a aprendizagem é guiada pelo próprio processo da vida de cada um.

Por isto, sempre é tempo de superação de limites! Se o seu limite, ou do seu (sua) filho (filha), for uma dificuldade de aprendizagem, conte conosco, você não está sozinho.

Doralina Enge Marcon

Doralina Enge Marcon

Psicóloga, CRP 12/10882

2 respostas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts Relacionados:
Relacionamento Humano

Que história é essa?

Certo dia eu estava em uma farmácia fazendo compras e escutei o pedido de socorro de uma voz masculina. Imediatamente, parei o que estava fazendo

Ler Mais »
Assine a Newsletter do Espaço!

Compartilhe: