Algumas semanas atrás fui convidada para participar de uma audiência pública sobre depressão. Encantada com a possibilidade de debater o assunto com diferentes pessoas da nossa sociedade, permiti-me pensar sobre essa realidade numa perspectiva social. Uma perspectiva completamente diferente da que eu estava acostumada a refletir. Afinal, não poderia desconsiderar que as minhas compreensões derivam dos limites que cerceiam as vivências de um atendimento psicológico individual.
Atraída pelo desejo de ampliar o meu conhecimento sobre os episódios depressivos, iniciei uma pesquisa sobre o tema, e o que encontrei me deixou muito preocupada.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente 350 milhões de pessoas no mundo, de diferentes faixas etárias, são acometidas de episódios depressivos. Estamos diante de uma realidade que representa o principal motivo de incapacidade e a segunda causa de morte entre as pessoas que cometeram o suicídio entre 15 e 29 anos.
Dos 350 milhões, 11,5 milhões dos casos registrados são brasileiros, o equivalente a 5,8% da população. Esse índice é o maior na América Latina e o segundo maior nas Américas, atrás apenas dos Estados Unidos.
Quando verifiquei a realidade dos estados brasileiros, descobri que a Região sul é a que tem o maior índice de pessoas com episódios depressivos, e Santa Catarina vem em segundo lugar. E querem saber mais? Dos 12,9% das pessoas diagnosticadas, 8,3% apresentam incapacidades graves em decorrência da depressão.
Eu não sei dizer o que esses dados provocam em você, mas em mim eles produzem um sentimento tão forte de pesar, tristeza e respeito pelo sofrimento humano, que me desperta a vontade de fazer algo em prol da pessoa que vive dentro de cada um de nós.
Esse desejo me fez voltar no tempo. Quando eu era uma jovem universitária, sedenta por conhecimentos científicos, encontrei um estudioso chamado Rollo May que, de uma forma muito existencial, me fez perceber que o problema fundamental da humanidade do século XX era o vazio, a solidão e a ansiedade.
Isso talvez não seja surpresa para muitas das pessoas que vivem no século XXI, a não ser pelo fato de que esses sentimentos nos levam a desacreditar na nossa capacidade de decidir sobre o rumo das nossas vidas e nos faz considerar que estamos mais seguros quando somos conduzidos pela opinião pública.
Dominados pela certeza de que somos incapazes de tomar decisões, passamos a procurar ajuda toda vez em que nos sentimos em perigo, esperando que nos oriente ou, no mínimo, nos console para não ficarmos sozinhos com o desespero. E ai daquele que não estiver pronto para nos servir na hora que precisarmos. Nós nos encarregaremos de transformá-lo em um vilão da pior espécie.
O tempo passou e, pelo que me parece, o vazio, a solidão e a ansiedade evoluíram para depressão, sinônimo do desânimo e da desesperança de que dias melhores virão.
Eu não estou falando daqueles desânimos e desesperanças passageiros, fruto de um acontecimento que nos deixa pesarosos e entristecidos. Estou falando de um estado de desinteresse, de uma falta de motivação e apatia, com ou sem causas aparentes, que duram semanas, meses e, por vezes, anos.

Nesses momentos somos tomados por um cansaço físico intenso. Nosso raciocínio fica lento, nossa concentração fica limitada e esquecemos coisas simples. E tudo isso sem falar nas dores e outros sintomas físicos sem justificativa médica: dores de barriga, má digestão, azia, diarreia, constipação, tensão na nuca e nos ombros, dor de cabeça, sensação de corpo pesado ou de pressão no peito, entre outros.
Como pensar em tudo isso sem associar esses sintomas a perda ou aumento do apetite, insônia ou sono intenso, diminuição do prazer sexual e, porque não dizer, do prazer na vida?
É isso mesmo! Escondidos atrás de todos os sintomas físicos, encontramos medo, insegurança, desamparo e vazio. Identificamos a diminuição ou, até mesmo, a incapacidade de sentir alegria. O pessimismo passa a fazer parte da realidade, transformando o mundo colorido em diferentes tons de cinza. A culpa, a baixa autoestima e a sensação de inutilidade e fracasso tomam conta do nosso ser, impedindo a realização das atividades do dia-a-dia.
É possível que a situação se torne se tão insuportável que leve as pessoas que vivem episódios depressivos a pensarem na morte como um caminho.
Se, por um lado, temos os tratamentos medicamentosos para estabilizar os neurotransmissores (serotonina, noradrenalina e em menor escala a dopamina), por outro lado, a conversa com pessoas de confiança e um acompanhamento psicológico centrado na pessoa podem ajudar quem apresenta episódios depressivos a reconhecer as possíveis distorções da realidade, oriundas dos pensamentos negativos, a questionarem as verdades absolutas que insistem em dizer que não ha saída, ao ponto de despertarem a coragem de conduzirem-se pelas próprias convicções, não como desafio ou obstinação, mas como algo em que acreditam.
Sei que essa tarefa não é nada fácil e que as dificuldades serão muitas, mas me digam: o que custa tentar?